15/04/2009

flecheira libertária II

Também presentes neste mês mais algumas amostras da contundente seção ‘Flecheira Libertária’, publicada toda terça-feira no site do nusol, bem como dois textos da ‘Hypomnemata’, esta última publicada mensalmente, também elaborada pelo pessoal do nusol. Ambas as seções são sagazes retratos das contradições insolúveis, que presenciamos no dia a dia de nossas vidas e num mundo cada vez mais dominado e manipulado pelos poderes do Estado.
São leituras que aguçam o senso crítico, que dão um choque na nossa justificável tendência para o otimismo e para a crença na capacidade humana de superação dos dilemas e perigos ao longo de nossa história. O problema é que dessa vez parecem estar muito mais urgentes e perigosas as crises, as contradições e o empobrecimento existencial-afetivo, sob as engrenagens de poder dos estados capitalistas.
Essas seções do nusol mostram com clareza e argúcia que não adianta tentar ir pelo pensar e agir mais fáceis, ou mais tranqüilizadores.
flecheira 106 - 14/04/09
história de vida
Presas tomam seus filhos nos braços e fogem a pé da prisão, no final da tarde do domingo de Páscoa, em São Paulo. Estão vivas! Enquanto as boas almas reclamam por falta de segurança, elas correm riscos por si e por seus filhos.

conservadorismo moderado: fragmentos de notícias
Reativar manicômios; renovar a cortina de ferro na Europa; saudades de Stalin; tribunal penal internacional;greve de fome de presidente contra o parlamento; cotas; proibicionismos; amor ao emprego; amor à escola; amor ao perdão; separar-arruinar-reduzir para depois incluir; condenar as drogas; cultuar a psiquiatria e a farmacologia; acreditar no fim das impunidades; fazer plástica para parecer menos velho (a); câncer; o ovo de Darwin; clamar por segurança, prisões e punições; viver solitário na vida computo-informacional; confiar na mídia; assistir abestalhado execuções por penas de morte na televisão; conviver com um micro big-brother...

satélites com batatas fritas
Nos anos 1960, a McDonald’ Corp. sobrevoava bairros em monomotores para localizar escolas e, perto delas, instalar lanchonetes. Nos anos 1970, passaram a buscar locais promissores de helicóptero. Na década de 1980, começaram a comprar fotos de satélite, para estudar padrões de crescimento urbano e, assim,
planejar novas lojas. Já nos anos 2000, a companhia criou um programa, o Quintillion, que indica lugares para novas unidades a partir do cruzamento de mapas georreferenciais, dados demográficos, fluxogramas de produtos, pessoas e padrões de consumo. Tecnologia como a da NASA, das polícias, dos governos, dos bancos, dos exércitos poderosos. Eis, também, o negócio de vender hambúrgueres na sociedade de controle!

flecheira 105 - 07/04/09
pedagogia da revista
R$ 945,00 sumiram da escola. A direção do estabelecimento de ensino chamou a PM e apontou os suspeitos. Diversos adolescentes foram obrigados a tirar a roupa para serem revistados. Nada foi encontrado. Cenas de uma escola estadual da periferia de Goiânia. “Queremos segurança nas escolas, mas tem que ter limite!” — reclamou um pai perplexo com a condução do caso. Sem perceber que abrir a porta para a almejada segurança implica perscrutação ilimitada, extensiva a quem dela acredita necessitar.

flecheira 104 - 31/03/09
um perigo para a sociedade. Qual?
Famosa proprietária de um shopping de consumo caríssimo de São Paulo foi presa juntamente com seus assessores. Ela foi sentenciada a mais de 90 anos de cana por diversos crimes de sonegação. Em poucas horas saiu livre porque os juízes não a consideram um perigo para a sociedade. De fato ela não é um perigo para a sua sociedade de granfinos. Ela é daquelas que se protegem dos outros: o perigo para a sociedade (dela). Isso tem um nome: seletividade do sistema penal. Tem outro: a propriedade é um roubo (das forças de invenção e contestação). E mais um: as outras sociedades são compostas por conformistas e otários.

melhor ou pior?

O governo brasileiro distribuirá à PM de todo o país armas do tipo taser, consideradas “menos letais”. Só isso já causaria o deleite da maioria, porém há mais: nas armas existem mecanismos de registro da hora do disparo e que permitem sua identificação para uma eventual auditoria. Deleite dos democratas. A assepsia da sociedade de controle induz à complacência. As palavras de um filósofo ecoam: perguntar o que é mais tolerável é cair numa armadilha.

Babel?

“A viagem foi bem menos perigosa do que a maioria esperava” declarou uma das integrantes da primeira visita turística ao Iraque desde 2003. Após beberem uma “ Heineken gelada” e caminharem por Basra, Uruk, Kerbala e Najaf, entraram no microônibus com ar refrigerado escoltado por seguranças particulares. Enquanto no porta-retrato ou no álbum destes turistas pioneiros ficarão pregadas as recordações desta “ viagem” em Bagdá, corpos e mais corpos silenciados por metralhadoras abrem espaço para novas e lucrativas expedições.

Hermanos...

Os correntes protestos na Argentina por mais segurança levaram o governo a anunciar um novo plano nacional de segurança pública: a contratação de 6.800 policiais, a compra de 500 viaturas equipadas com GPS, 5.000 câmeras de vigilância, além de 21.500 celulares a serem distribuídos para os caguetes de plantão. Os pontos principais de ação são as zonas de vulnerabilidade: periferias de Buenos Aires e de Mendoza. As pessoas reivindicam, confiam e apreciam cada vez mais equipamentos tecnológicos de monitoramento; é a naturalização de uma conduta policial em nome do bem comum e da prevenção geral. Desejam e clamam pela propagação do governo sobre as suas vidas e sobre a tua.

“ nômade não é forçosamente aquele que se movimenta: existem viagens paradas num mesmo lugar, viagens em intensidades” (gilles deleuze)

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