25/08/2015

os domingos

Todas as funções da alma estão perfeitas neste domingo.
O tempo inunda a sala, os quadros, a fruteira.
Não há um crédito desmedido de esperança
Nem a verdade dos supremos desconsolos -
Simplesmente a tarde transparente
Os vidros fáceis das horas preguiçosas
Adolescência das cores, preciosas andorinhas.

Na tarde – lembro – uma árvore parada
A alma caminhava para os montes
Onde o verde das distâncias invencidas
Inventava o mistério de morrer pela beleza.

Domingo – lembro – era o instante das pausas
O pouso dos tristes, o porto do insofrido.
Na tarde, uma valsa; na ponte, um trem de carga;
No mar, a desilusão dos que longe se buscaram;
No declive da encosta, onde a vista não vai
Os laranjais de infindáveis doçuras geométricas;
Na alma, os azuis dos que se afastam
O cristal intocado, a rosa que destoa.

Dos meus domingos sempre fiz um claustro.
As pétalas caíam no dorso das campinas
A noite aclarava os sofrimentos
As crianças nasciam, os mortos se esqueciam mortos
Os ásperos se calavam, os suicidas se matavam.
Eu, prisioneiro, lia poemas nos parques
Procurando palavras que espelhassem os domingos.

E uma esperança que não tenho.

paulo mendes campos - minas (1922 - 1991)