29/09/2009

rapariga

tu própria, que podes ter a noção e ao mesmo tempo
o atrevimento de simplesmente expor
de vez em quando uma opinião
ou um seio: quando começa isso

e no fundo quando acaba? as mulheres
são feitas de raparigas, aos quarenta
ainda deitam a língua de fora como aos quinze
ficam cada vez mais jovens
não sabem não seduzir. como a poesia:
um gato que prudentemente caminha sobre as teclas
de um piano e olha para trás:

ouviste? viste-me?

ah, o ar jovem das raparigas de quarenta
como umas vezes querem, e outras não
mas afinal sempre, se repararmos bem.
onde estão os bons velhos tempos? estão aqui, esses tempos.
(herman de coninck - bélgica)
Herman de Coninck, poeta belga (Mechelen, 1944) foi traduzido em Outubro de 1994 nos seminários de tradução colectiva de Mateus. A Quetzal editou-o em 1996, num livrinho revisto, completado e apresentado pelo poeta Nuno Júdice, intitulado “Os Hectares da Memória”. Coninck, um dos mais importantes flamengos do pós-guerra, foi mais um desses poetas europeus – como Egito Gonçalves, – que tanto incomodaram os puristas por possuir uma notável capacidade de apreender de um quotidiano, aparentemente estéril e banal, instantes sagazmente luminosos, através do uso de uma linguagem com notável capacidade discursiva, onde o humor não é o menor dos seus recursos. Foi um poeta do seu tempo: a fruição do leitor na leitura dos seus poemas resulta, suponho, da identificação com imagens suas contemporâneas que, com aparente objectividade, se dão a ler no poema. Herman de Coninck morreu subitamente numa rua de Lisboa, em 1997, a caminho de uma reunião de poetas (do blog poesia ilimitada).

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