a água da bica
para que você venha
e lave teu rosto criança
tomada a atitude
ela seguirá no fluxo normal
levando para onde você não sabe
teus sonhos da noite dormida vicente filho
O romancista é um poeta desgraçado.
Condenado a sua infalível pantomima
Gesticula abarcando sua infindável solidez
Somente com olhos, argutos - acima de tudo, perenes.
É um espantalho carcomido pelo martírio
de ser incapaz de dizer
Coisas.
É a um só tempo verme e coveiro, criatura emblemática
Onde a carência de gestos apenas lhe curva as costas.
É, portanto, desses seres capsulares.
Casulo de seda amparado por brocas.
E, talvez, bocas.
Satisfaz-se com ínfimas atribulações
mas permanece sentado, alvejando
A blindagem sagrada do tempo com vicejante suavidade
caminhando, sabe deus, com que tez altiva e mole
molestando a carnavalesca desordem das impossibilidades.
Curiosa engrenagem de instinto subjugada pela vergonha
de saber-se inconciliável com
Suas verdades.
Somente a concisão lhe impressiona.
george saraiva
que obstinação nesta árvore em dar
por dar frutos por todo o pomar.
e que obstinação em virar lenha
no fogo das causas em que se empenha,
negando-se ao discurso enfadonho
que incendeia as pontes para o sonho,
negando-se a ouvir os boletins
de um mundo de inúteis galarins,
e renegando o homo-hierarchicus
com todos os seus cânceres tão práticos,
rasgando a pele e a carne da aparência
em busca dessa sempre esquiva essência,
e transformando em mantra a vida humana
vibrando nessa consciência una.
(waldo motta, "waw")
olha aí do seu lado
pode ser ele
bin laden
ei, olha de lado
não olha direto
mas onde ele tá
à direita
à esquerda
do lado de lá
do lado de cá?
agora olha lá bin laden
escorregando
nas grutas e ladeiras da ásia
ladino, latino
olha bin laden
bombando todas
bum! bum!
boing! boing!
bom bom?
e olha os doidos dos árabes
orando para bin laden
e lá em cima no norte
a ladainha da morte
o louco balé de bush e blair
envoltos nas bandeiras listradas
por quanto tempo sangrentas
e ensangüentadas?
bin, bin, bum, bum!
é preciso que a memória
se lave nesses laivos de dourado
que descem escadas de nuvens e pedras
a ondular como carícias aéreas
sobre verdes recém-amanhecidos
(até a dura mãe-montanha
se curva a admirar:
a chuva de ouro matinal
sobre as cabeças das árvores-crianças)
e rasgue como faca
os espessos véus de tempo
rumo a surpresas primevas
e aí erga templos despojados
e precários sustentáculos
antes que a ponte de tempo
se esfume no instante
e que a fome de verbo
de novo ignore a si mesma
e ao alimento aí à tua frente