por várias semanas, no ano de 2000, eu acompanhei as idas desse senhor a uma pracinha perto de onde eu morava, aqui no centro de vitória.
sempre após o almoço, e sempre solitário, calado e meio que melancólico.
algum tempo depois eu vi que era mais um dos milhares de catadores de papel e de quinquilharias, que vagam pelas esquinas
e lixos das cada vez mais absurdas cidades dos homens.
e suas idas à pracinha me pareciam uma espécie de parada de beira de estrada, um repouso, um intervalo na sua solitária e anômina jornada em meio à cidade.
somente consegui registrar suas idas e vindas em três ocasiões - ele sempre usava as mesmas duas camisas, na maior parte dasa vezes com uma sacola de plástico nas mãos, certamente a carregar suas parcas coisas.
e o que me chamava a atenção era o fato de ser uma parada na qual o peregrino não se permitia nem mesmo se sentar ou se deitar num dos bancos da pracinha, como qualquer andarilho o faria.
como se um resto de dignidade o impedisse de demonstrar que era apenas mais um andarilho, um catador de coisas, de restos.
ou como se se estivesse a fazer - ali em pé, solitário e silencioso - um espécie de ato de contrição.
um ato de contrição pelo pecado, pela falha de não ter sabido, ao longo da vida, tornar-se minimamente um vencedor, por não ter aprendido a se comportar de maneira minimamente obediente, disciplinada, ou apenas esperta, em meio à vitoriosa estupidez da civilização ocidental.