02/12/2008

minas - de ouro e horizontes

Em 1997, em BH, participei de uma criativa oficina de poesia, orientada pelo escritor mineiro Duílio Gomes. Num dos encontros, Duílio pediu que criássemos um poema a partir da palavra 'mariana'. Na ocasião criei o poema abaixo: 'mina mariana'. Por algum tempo fiquei inquieto, achava que faltava alguma coisa.
Depois desdobrou-se nesta trilogia, onde falo de passado, presente e vislumbres ou promessas de futuro, tendo como cenário e fio condutor as três capitais de Minas Gerais e o caminho para o mar - entre outras coisas, hoje vejo nos poemas uma espécie de reversão ou superação da história (dolorosa mas generosa) como se Minas ainda pudesse oferecer algo ao mundo, para além dos metais e minérios arrancados de suas entranhas - ou seja, percebo hoje que esses poemas são o meu tributo inconsciente a essa Minas mítica que carregamos dentro de nós, a Minas inconfidente, libertária, redentora, que o nosso imaginário insiste em preservar.

mina mariana

minas não mira o mar
o mar não ri para minas
minas canta uma outra ária
bebeu de outra mina: mariana

ouro preto, ponte inconfidente

a pele - becos e escadas, ruas e templos,
é polvilhada de puros poros de tempo

a alma - amores e escravos, poetas e o polvo
é ponte entre a mina e o horizonte

o ouro: duro, dourado e o sangrado alferes
a alimentar o polvo
a apontar perto e reto o porto ao povo

horizonte belo

floresta concreta plantada no prado
gestada já na mina, nutrida no ouro

promessa vibrátil de amoroso
contorno ao derredor da serra sagrada
consagrada

mas por ora: o polvo
devora a cordilheira e a seara

enquanto imensa família
ora pujante ora indigente
labuta o barro do preto sustento
de serena e morena estrada-manhã

a marchar célere como o amazonas
rumo ao cerrado e serrando ao meio
a bastilha e as esquadrilhas do polvo

e então talvez o mar e as minas
se beijem - aliviados
e o mar leve às aldeias do globo
o polvo - domesticado

o mar a murmurar em cada diferente porto
o nome da canção esquecida - canhota, torta
que brota da mina pura, singela
trilha a ponte de ouro e o horizonte belo
e jorra vibrante lavanda no seu corpo gigante.
tal mágica e rubra bandeira
talvez.

roberto soares

ecos

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