01/11/2010

rilke e o morrer verdadeiro

Agora se morre em 559 camas. De um modo industrial, obviamente. Com uma produção tão grande, a morte individual não é tão bem feita, mas isso também não importa. O que conta é a quantidade. Quem hoje ainda dá alguma coisa por uma morte bem acabada? Ninguém. Mesmo os ricos, que poderiam se permitir uma morte minuciosa,  começam a se tornar descuidados e indiferentes; o desejo de ter uma morte própria se torna cada vez mais raro. Mais um pouco e será tão raro quanto uma vida própria. Deus, está tudo aí. A pessoa chega, encontra uma vida pronta, e é só vesti-la. A pessoa quer embora ou é obrigada a tanto: bem, nenhum esforço: Eis vossa morte, senhor. As pessoas morrem do jeito que der; morrem a morte que cabe na doença que elas têm (pois desde que todas as doenças são conhecidas, também se sabe que os diferentes finais fatais cabem às doenças e não às pessoas; e o doente, por assim dizer, não tem nada a fazer).
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Quando penso em minha casa, onde agora não há mais ninguém, acho que no passado deve ter sido diferente. Outrora se sabia (ou talvez se suspeitasse) que se tinah amorte dentro de si da mesma amneira que o fruto tem os seus grãos. As crianaçs tinham uma morte pequena dentro de si, eos adultos uma grande. As mulheres a traziam no seio, e os homens no peito. Ela era uma posse e isso conferia à pessoa uma dingidade peculiar e um orgulho calado.
(rilke - os cadernos de malte laurids brigge)
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'Pois, perto da morte, não se vê mais a morte
e olha-se fixamente para fora
talvez com um grande olhar de animal'

'Ó, senhor, dai a cada um a sua morte
o morrer que seja verdadeiramente fruto desta vida
onde ele encontrou amor, sentido e aflição'
(rilke - fragmentos)

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se ao menos uma vez tudo se aquietasse
se se calassem o talvez e o mais ou menos
e o riso à minha volta...
se o barulho que fazem meus sentidos
não perturbasse mais minha vigília...
então, num pensamento multifário
poderia eu pensar-te até aos teus limites
e possuir-te (só o tempo de um sorriso)
e oferecer-te a vida inteira, como
um agradecimento
(rainer rilke, "livro de horas")

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