os vivos ouvem poucamente. as plantas,
como o elemento aquático domina,
são dadas à conversa. a menor brisa abala
a urna de concórdia estremecida
que, assim, sensível, se derrama
e é solidão solícita.
os vivos não ouvem nada.
mas, havendo acedido a essa malícia
de experiência cândida,
os mortos deixam que o ouvido siga
o fluvial diálogo das plantas
umas com outras e todas com a brisa.
melhor ainda. quando, nas noites cálidas,
as plantas se sentem mais sozinhas,
os mortos brincam à imitação das águas
inventando palavras de consonâncias líquidas.
e esse amoroso cuidado de palavras
a urna de concórdia vegetal espevita
até que, a horas altas,
a noite, os mortos e as plantas
caiam no sono duma luz solícita.
fernando echevarría, em "sobre os mortos" - portugal
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