22/12/2010

o natal como resistência

Abaixo seguem considerações acerca do Natal.
Não tive tempo de selecionar alguns poemas, tal como gostaria.
Por isso, tomo a liberdade de remeter o leitor para texto, poemas e imagens que postei aqui no blog em dezembro de 2008:
"então é natal..."

o natal como resistência

Os hábitos consumistas, barulhentos e presunçosos - estimulados pelas mensagens espetaculosas e de um nauseante tom comovente-humanitário da mídia - já tornaram a passsagem de Natal e Ano Novo algo tão sem graça, repetitivo e superficial que fica até chato fazer a crítica dessas efusões, patéticas em suas ilusões de comunhão, de fraternidade e de real confraternização entre pessoas.

Mas tudo bem, não deixa de ser um momento de resistência, um momento de promessa para uma civilização futura, de fato voltada para o humano, para a vida, o planeta e para o Cosmos, e não uma humanidade rastejando apática e ilusoriamente feliz sob uma engrenagem estúpida, antihumana e burra como o é atualmente a engrenagem capitalista-ocidental.

Se não vale a pena fazer essa crítica, então que confraternizemos todos dentro de nossos estreitos e exclusivos círculos familiares, sociais e profissionais, até onde puder ser legitimamente honesto e moralmente suportável.
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Mas, por outro lado, não poderia deixar de divulgar esse belo e poético texto de Padre Alfredinho, "Tocamos flauta e vocês não dançam", afinal é um verdadeiro e contundente manifesto em prol de uma Igreja Católica que realmente faça jus às palavras que os seus padres e bispos lançam de seus púlpitos por ocasião do Advento e do Natal.

Uma Igreja que deveria se fazer cada vez mais presente nas lutas dos povos, nesse momento de expectante encruzilhada pelo qual passa a humanidade, mais especificamente as sociedades ocidentais, e que no entanto é uma Igreja que permanece distante das tensões e angústias que se avolumam neste decisivo século XXI.

Talvez se faça alguma ressalva ao texto de Padre Alfredinho, no sentido de o autor clamar demais por uma Igreja mais atuante no aspecto social, concreto, no cotidiano dos povos e das pessoas.

E, nesse caso, Pe Alfredinho esquecer-se-ia de que também é tarefa da Igreja, ou de qualquer religião, conservar e alimentar a reverência, a transcendência. E reverência e transcendência supõem silêncio, contemplação e às vezes também rituais, momentos litúrgicos ancestrais - seculares e às vezes até milenares. Ou seja, para esses críticos a religiosidade não se esgota em ações e missões no cotidiano, em atender aos 'desafios da história'.

Mas o texto de Pe Alfredinho não traz 'receitas' ou exigências simplificadoras, não propõe um sacerdócio unilateral, reduzindo a religiosidade a uma mera ação transformadora das estruturas. O que o texto resgata é a necessidade de haver um equilíbrio entre as duas tarefas da Igreja: a tarefa de celebrar o terreno e o divino, a tarefa da contemplação e da ação, da transcendência e da imanência.

Tanto que essa postura de denúncia de excessos e de busca do equilíbrio já estava presente num outro texto seu, e que também publicarei no próximo mês: "O espírito sopra onde quer".
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Para quem não sabe, Pe. Alfredo Gonçalves é ligado à ala progressista da Igreja Católica e atua nas Pastorias urbanas da cidade São Paulo, e também ministra palestras e cursos de formação pelo Brasil afora, para pastorais sociais e outras entidades e movimentos ligados à Igreja Progressista - ainda bem que esses movimentos ainda existem aqui no Brasil e na América Latina, e felizmente cada vez mais atuantes, nesse ambíguo momento de avanço institucional de governos progressistas, mas também de desmobilização e de perda de autonomia dos movimentos populares, ao menos aqui no Brasil.

O texto de Pe Alfredinho aproxima-se bastante daquela síntese tão necessária entre religiosidade e filosofia, entre transcendência e fé, uma religiosidade que contemple a) uma vivência da liturgia e da fé b) uma ação evangelizadora que se traduza em ação transformadora das estruturas injustas e pecadoras e c) uma religiosidade ao mesmo tempo mais cósmica e existencial, que se alimente da e na transcendência do divino e do mistério.

Ou seja, uma religiosidade que vai além até mesmo da clássica complementação entre fé e obras, exigindo uma terceira a presença : a relação especial, única e necessária de cada consciência vivente com o Ser que nos cerca e com a Fonte desse Ser, num testemunho admirado do fascínio de se saber, de se sentir portador dessa relação especial com a Fonte.
Todos os meses tenho recebido e lido vários de seus textos, e como não tenho tido tempo para selecioná-los e publicá-los, publico, então, mais dois textos de Pe Alfredinho nesta época do Advento: "Labirinto da Oração" e "O silêncio".

São leituras bastante apropriadas para essa época de interiorização, reflexão e de retrospectivas existenciais - claro para quem ainda consegue dialogar com o silêncio e com o Cosmos, nessa época de falatórios, efusões ingênuas e manipuladas e de barulhentas e presunçosas confraternizações.

Ainda acerca do Natal, segue também um texto, "Às vésperas do Natal", que fala exatamente de como somos irresistivelmente levados a nos envolver, a nos deixar seduzir pelo clima de falsa efusão e de falsa confraternização dos festejos de fim de ano, as efusões e convocações de caráter comovente-humanitário de que falei no iício desta postagem.

De qualquer forma, essa sedução e essa adesão ao espírito natalino - mesmo que conspurcado pela mídia e pelas engrenagens narcotizantes da moderna e espetaculosa sociedade de controle – mesmo assim essa adesão significa um real anseio de real confraternização entre povos e pessoas.

E se o anseio e a esperança existem, é porque há uma negação das nauseantes engrenagens dessa sociedade de controle; mesmo que seja uma negação inconsciente, mesmo que seja uma revolta que não a se assume, temos então que continuar a tarefa de tentar trazer para a humanidade e para o planeta o verdadeiro Advento da vida, do mistério e do divino.

Nesse sentido, no sentido da esperança, da resistência e da ação de enfrentamento e de transformação, vale a pena sim dizer

FELIZ NATAL!!!

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