23/10/2011

aos que vão nascer

Nestes tempos de perplexidades e incertezas, mas também de vibrante rebeldia, bastante apropriada a publicação deste também vibrante poema de Brecht, dramaturgo e poeta alemão (1898-1956)e militante da revolução dos povos. Na verdade, é apenas a segunda parte do poema, que é dividido em três seções.

Oportunamente publicarei as outras duas. Por ora, essas chamejantes palavras a lembrar que a atual Rebelião dos Povos tem firmes raízes na história,  a lembrar que a história dos povos é feita de resistência e de lutas - por mais que os mecanismos de dominação cultural queiram apagar, neutralziar ou diminuir essa memória de lutas e de crenças dos homens na transformação e na evolução  das formas de convívio entre eles.
A atual Rebelião é mais um passo na direção dessa transformação e dessa evolução, e o poema de Brecht vem lembrar-nos  outros passos dados nessa longa e necessária caminhada.  

aos que vão nascer - parte II
bertolt brecht

Cheguei às cidades em tempo de desordem
quando a fome reinava.
Entre os homens cheguei em tempo de revolta
e rebelei-me com eles.

Assim se foi o tempo
que sobre a terra me foi dado.

Minha comida engoli-a entre os batalhas
ao dormir deitei-me entre matadores
cuidei do amor com descaso
e a natureza eu olhava sem paciência.

Assim se foi o tempo
que sobre a terra me foi dado.

As ruas levavam ao pântano do meu tempo.
As palavras entregavam-me aos carrascos.
Eu tinha tão pouco. Mas os governantes
ficavam mais confiantes sem mim, eu esperava.

Assim se foi o tempo
que sobre a terra me foi dado.

Os fortes eram poucos. A meta
ficava bem longe
claramente visível, mas também para mim
tão difícil de alcançar.

Assim se foi o tempo
que sobre a terra me foi dado.

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Aqui, uma outra versão do poema, para quem gosta de comparações entre traduções diferentes:

À cidade cheguei em tempo de desordem
Quando reinava a fome.
Entre os homens cheguei em tempo de tumulto
E me revoltei junto com eles.

Assim passou o tempo
Que sobre a terra me foi dado.

A comida comi entre as batalhas
Deitei-me para dormir entre os assassinos
Do amor cuidei displicente
E impaciente contemplei a natureza.

Assim passou o tempo
Que sobre a terra me foi dado.
As ruas de meu tempo conduziam ao pântano.
A linguagem denunciou-me ao carrasco.
Eu pouco podia fazer. Mas os que estavam por cima
Estariam melhor sem mim, disso tive esperança.

Assim passou o tempo
Que sobre a terra me foi dado.

As forças eram mínimas. A meta
Estava bem distante.
Era bem visível, embora para mim
Quase inatingível.

Assim passou o tempo
Que nesta terra me foi dado.

(Tradução de Paulo César de Souza, São Paulo: Editora 34, 2000)

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