12/07/2011

autoretato em avião

em classe económica

dobrado como um embrião
esmagado num assento estreito,
tento recordar
o aroma do feno recém-cortado
quando em Agosto as carroças de madeira
descem dos prados de montanha,
baloiçando pelas estradas de terra
e o condutor grita
como os homens sempre gritam quando entram em pânico
- gritaram dessa forma na Ilíada
e nunca mais se silenciaram desde então,
nem durante as Cruzadas,
nem mais tarde, muito mais tarde, próximo de nós,
quando ninguém os escutou.

estou cansado, penso naquilo o que
não pode ser pensado - no silêncio que reina
nas florestas quando as aves dormem,
sobre o final próximo do verão.

mantenho a cabeça entre as mãos
como se a protegesse da aniquilação.
Visto de fora, sem dúvida que
pareço imóvel, quase morto,
resignado, merecendo simpatia.

mas não é assim - sou livre,
talvez mesmo feliz.
Sim, seguro a pesada cabeça
em minhas mãos,
mas dentro nasce um poema.

adam zagajewski - polônia
(extraído de poesia ilimitada)

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