30/11/2008
ah...
o começo da agonia
que de tão vadia me faz sorrir
como se ainda fosse o tempo
em que pardais drogados
mexiam nos telhados
enquanto o sol atravessava a vidraça
é apenas agonia o sorriso de agora
(vicente filho)
love star - amor de doido
que eu vi - tentei laçá-la
com o melhor laço
que eu mesmo teci
pra amarrá-la num esteio
pra depois ficar a vê-la
vergonhosa a sorrir
da bravura que fiz
brava noite
baldo braço
que nunca desiste
não é triste meu sonhar
se a estrela existe
(vicente filho)
sobre mariana botelho
Sim, para além do jogo verbal fácil e previsível, o fato é que se é logo remetido para o nome de seu espaço na internet.
Surpreende a maneira singela e espontânea como Mariana expressa obscuridades, vivências e encontros de difícil descrição. Sua poesia está inundada de águas e nostalgias, de silêncios e sedes, mas tudo isso partilhado de fato com quem a lê. Há que aplaudir ainda a naturalidade e a pertinência com que ela brinca, joga, dialoga com o próprio poema, com o próprio ato de criar, fecundar poesia, também isso singelamente ofertado a leitor, sem necessitar complexas e sufocantes dissecações.
Essa facilidade de construir pontes com o leitor – seja ele quem for, artista ou não – sem abrir mão da invenção, só vem a confirmar algo que já tivemos oportunidade de abordar em outro texto aqui no blog ("sobre o desvelar"): é possível, sim, dar luz a uma poética elaborada e inquieta e, ao mesmo tempo, preservar um mínimo de contato com o leitor – claro, desde que esse contato seja uma das preocupações, ou propostas, do poeta.
Lendo os poemas de Mariana lembro-me imediatamente de outro poeta presente aqui no blog, Vicente Filho, também lá do norte de Minas - Poté, próximo ao Vale do Jequitinhonha. Claro, a fala de Mariana é mais elaborada, o poema é mais burilado, mas percebe-se nos dois a mesma espontaneidade e a mesma vocação para a concisão, o poema enxuto. Posso estar até entusiasmado, mas me parece haver uma simbiose perfeita entre os poemas “sertão, poté”, “nascente” e “água’’.
sobre vicente filho
Há na sua poesia uma nostalgia de tempos, lugares, sensações, mas nostalgia que às vezes se compraz em ironizar a si própria, ironia, ao fim, que consegue tornar a nostalgia ainda mais melancólica e poética.
Há também uma comoção indignada com as tristezas provocadas pela inevitável marcha da história, mas uma comoção também marcada pela discreta ironia do poeta, ora com sua própria indignação, ora com a tristeza e o desamparo daqueles são afetados pela implacável marcha; e também aqui uma ironia que só faz crescer a indignação e a perplexidade do poeta, como se ao invés de cinismo e descrença, a ironia mais o irmanasse àqueles de quem fala.
E por fim a fala amorosa, com seus encontros e desencontros. A mesma e sutil presença de uma ironia desamparada, ou o mesmo desamparo irônico, mas ironia e desamparo permeados por uma forte e explícita celebração da pessoa ou imagem amada.
apresentação geral
Os de Cecília Meireles: "Mar absoluto e retrato natural", Ed. Nova Fronteira, 1983 e "Doze Noturnos de Holanda", Ed. Nova Fronteira, 1986.
Os Poemas de Rainer Maria Rilke foram selecionados de "O livro de horas", Editora Civilização Brasileira, 1994, tradução de Geir Campos.
Todos os poemas de Rilke e muitos dos de Celan não possuem títulos, têm apenas primeiras palavras em maiúsculas -tal como grafado nos originais.
Os meus poemas e os de Vicente Gonçalves Filho são inéditos. Os de Carlos Ernesto foram extraídos de "Flutuais e Cartas ao Mar fechado", edição do autor, e poemas inéditos.
Os poemas de J. Leo Araujo foram extraídos de “Poemas & Poemas’, edição do autor (1976).
Os poemas de Mariana Botelho foram extraídos do seu blog "Suave Coisa" - http://quelevequenada.blogspot.com/.
poesia de grafites
As fotografias abaixo são registros de grafittis, feitos nas ruas do Centro de Vitória.
O registro parece oportuno, pelo fato de as palavras e figuras saírem da trivialidade ingênua ou dos códigos herméticos de tribos urbanas, que geralmente predominam nessas manifestações.
Claro que uma leitura mais exigente poderia facilmente apontar um certo primarismo e obviedade nos jogos verbais de alguns dos grafittis. Mas para se atingir, de forma mais ampla, o seu heterogêneo e movimentado público, os grafiteiros não podem e nem precisam se embrenhar em construções verbais demasiadamente experimentais. Desse ponto de vista, certamente o autor - ou autores ? - tem a concisão, o ineditismo e a coloquialidade da mensagem na medida certa, próprios para atrair o olhar dos leitores, ou dos transeuntes, numa despretensiosa mas sedutora amostra de poesia nas ruas.
ir para poesia de grafites II
27/11/2008
flor noturna
precisava ver!!!
acima o canto, fora do normal
preso numa pluma viva
ia à vida fugidia
a gemer duplamente
eu voava pra baixo
e entoava alto
a voz da canção
num vazio longe de encontros
navegava sem leme, sem luar
sem mar...
à glória que nunca há
vicente filho
ecos
água
Água.
fui sentir o cheiro de
terra molhada.
ficamos ali
eu e meu corpo,
cantando a plenitude do mato
depois da chuva.
Água.
me amei.
mariana botelho
ecos
26/11/2008
minhas camisas-de-força
minha flor de lis
bem que mais quis
confesso:
usava suas camisas
para ficar dentro de você
era lastro, era vício
amar é atitude
que temos de temer
ecos
13/11/2008
as folhas caem
as folhas caem como se do alto
caíssem murchas, dos jardins do céu
caem com gestos de quem renuncia.
e a terra, só, na noite de cobalto,
cai de entre os astros na amplidão vazia.
caímos todos nós. cai esta mão.
olha em redor: cair é a lei geral.
e a terna mão de Alguém colhe, afinal,
todas as coisas que caindo vão.
(rainer rilke, "livro de horas")
10/11/2008
"Poesia Viva"
Editorial: vida urbana
Alienação
O solitário gesto de viver
não demanda a coragem que há na faca,
na ponta do punhal e até no grito
de quem fala mais alto e está coberto
de razões, de certezas, de verdades.
O gesto de viver se oculta em dobras
tão íntimas do ser, que o desfazê-las
é mais que indelicado, é violência
que nem sequer se pode conceber.
O gesto de viver é só coragem,
mas, de tal forma próprio e incomparável,
que não se exprime em verbo, imagem,
mímica
ou qualquer outra forma conhecida
de contar, definir ou explicar.
A coragem no gesto de viver
está em coisas simples, por exemplo,
na diária decisão de levantar.
E mais, em se vestir e trabalhar
por entre espadas, punhos e navalhas,
peito aberto, sem armas, passo firme,
e à noite, ainda intato, regressar
Reynaldo Valinho Alvarez
Mem de Sá com Gomes Freire
Paulo, codinome Kelly Lee.
De Ubá, o teimoso sotaque – “uai!”.
Pensa na mãe morta, lembra do pai,
E, no trottoir noturno, sorri.
Lembra do pai, que a pôs para fora,
dos irmãos, que lhe viraram a cara.
Mas sorri, por hábito, e, coisa rara!,
uma lágrima escapa-lhe, agora.
Ubá é tão longe, a infância perdida...
E tudo, ali, parece inverossímil!
A lágrima sai negra, do rímel:
“Pior que a morte, só mesmo a vida!”
Kelly - e seu troféu é o codinome!,
exibe, quase nu, seu belo corpo.
Paulo morreu pra sempre, está morto,
afogado em litros de silicone!
Mas algo dele resiste nela,
bem ali, em plena Mem de Sá!
Talvez um velho sonho ou, quiçá,
sua morta mãe, que, por ela, vela.
Ricardo Thomé
A moça na praça
O vento atravessa
a praça
um raio rompe
a carcaça
da negra nuvem
que se esgarça
e a paisagem
se embaça
Mãos se abandonam
sem graça
coração se
despedaça
a moça chora
e disfarça
lágrimas de chuva
inundam a praça
Silvio Ribeiro de Castro
Sol indo embora nuvens de chumbo
no ônibus Náuseas cheiro ácido suor
amônia álcool sangue pisado pingos
do dia tiritante lida Náuseas me
acomodo pé suspenso no ar ombro a
ombro troncos encostos toques maus
pensamentos Náuseas solavancos
trancos balanços paradas entrecortes
gente saindo entrando empurrões
cotoveladas suspiros estalidos crianças
zumbindo guinchos batidas hip-hop
Náuseas cabeças fixas olhos giratórios
ar sufocativo motorista invisível
toco a estridente campainha ele nem
se liga
Leda Miranda Hühne
05/11/2008
uma alca-téia em belô
exércitos de ciscos
para olhos abertos
tribos de maníacos
para vítimas certas cobertores rasgados
nas indigências descobertas hoje sofremos incertos
mendigos ao relento
enquanto no Foro das Américas
os lobos acham consenso vicente filho
ecos
fsm 2009
Nascida de discussões entre associações presentes no Fórum dos Povos Ásia-Europa, realizado em Pequim em Outubro de 2008, nela foi feita “uma avaliação das implicações da crise económica mundial e da oportunidade que ela nos oferece para trazer para a praça pública algumas das alternativas, viáveis e motivadoras, nas quais muitos de nós temos vindo a trabalhar há décadas.”
Abaixo o convite enviado por Helder Gomes:
FSM 2009
Pauta 1 - Debate
A Natureza da Crise Econômica Mundial
O papel dos movimentos populares
Reinaldo Carcanholo e Helder Gomes
Pauta 2
Organização da Delegação Capixaba para o FSM 2009
Quinta-Feira - 06/11 - 18h30min
Conexões de Saberes
Centro de Vivência da UFES
epílogo - simón zavala
e te atirei minhas mãos
te entreguei minha palavra
desgarrada
te disse que o meu nome
era emprestado
e que eu era outro
enfiado neste corpo
te contei do meu sonho
forjado nos temporais
te mostrei o pedaço de minha alma
que permaneceu em minha mãe
por fim te ofereci minha sombra
no teu aniversário
e pendurei minhas pegadas
no teu quarto
um dia
me acordaram e encurralaram
outra vez as horas
me despedi de todos os teus desejos
e te deixei à porta
o meu olhar
(Simón Zavala Guzmán – Guayaquil, Equador, tradução: Roberto Soares)
ecos
carta aberta a barak obama
Mas nesse momento de euforia generalizada - e legítima - com a eleição de Barak OBama, entendemos como benvinda a Carta Aberta, divulgada pela Agência Carta Maior. Afinal, por mais bem intencionado que seja esse ou aquele governante, não está em suas mãos mudar radicalmente as posições de um determinando governo, muito menos as estruturas e exigências de um determinado modelo de produção – ainda mais em se tratando dos governo dos Estados Unidos e do modo de produção capitalista.
De qualquer forma, o jovem e promissor Barak OBama terá feito muito se corresponder às expectativas e sonhos daqueles que o elegeram. Quanto às expectativas e anseios dos demais povos do mundo, parece que o documento da Carta Maior, divulgado abaixo, tem muito a lhe dizer.
(Esta carta está aberta a adesões de veículos da pequena grande imprensa alternativa de todo o mundo)
02/11/2008
nós, embalalagens ambulantes

