11/03/2010

horrores do espírito santo (I)

A matéria abaixo, embora curta, provocou uma certa agitação no Espírito Santo, principalmente entre as entidades e as pessoas ligadas aos movimentos sociais e aos direitos humanos. O texto é de autoria do jornalista Elio Gaspari e aborda a importante reunião que haverá em Genebra, entre representantes da ONU e dos direitos humanos do ES, para tratar da deprimente e desumana situação em que se encontram os presídios do Espírito Santo.

Um verdadeiro espetáculo de horrores, do qual tivemos uma amostra na excelente, embora chocante, reportagem da TV Record, que foi exibida na segunda-feira à noite - provavelmente também em função desse encontro em Genebra, na Suíça, que certamente contribuirá para desnudar ainda mais a situação de desmando, de descaso e corrupção que ainda contamina, e muito, as instituições do Estado.
A Comissão de Direitos Humanos do ES teve que recorrer à ONU, já que não conseguiu resolver, nem no âmbito estadual nem no federal, a trágica e assustadora situação dos presídios capixabas. Esse envolvimento da ONU certamente denigre não apenas a imagem do Espírito Santo como do próprio país.

Em dezembro de 2008, por ocasião da deflagração da Operação Naufrágio, a Polícia Federal, após demoradas e cuidadosas investigações e seguindo determinação do STJ, prendeu três desembargadores e o próprio presidente do Tribunal de Justiça do ES - fato histórico, como nunca antes tinha acontecido neste país, parodiando o presidente Lula.
Na ocasião, alguns analistas mais sérios entenderam que, além de conivente ou omisso para com os descalabros de políticos, desembargadores, conselheiros do Tribunal de Contas e demais autoridades investidas pelo povo, o governo Hartung foi de certa forma responsável por esse mesmo descalabro e degradação das instituições.

Isso, a partir do momento em que estabeleceu relações de favorecimento e pressão em relação aos membros dos poderes Legislativo e Judiciário, num projeto explícito de governar praticamente sem nenhuma oposição, quase que de forma imperial – aliás, nos meios capixabas mais esclarecidos e engajados o governador Hartung é chamado exatamente de “O Imperador”.

Enfim, com a Operação Naufrágio - que ainda está nos seus desdobramentos judiciais, com a possível e breve instauração de ação penal contra 26 envolvidos – e com esse envolvimento da ONU na questão dos presídios, fica ainda mais patente que o governo Paulo Hartung, ao contrário daquilo que alardeia em suas peças publicitárias, poucas transformações promoveu naqueles aspectos que mais afetam a população: segurança, saúde, educação e, principalmente, cidadania e transparência na governança.
E isso tudo, apesar do verdadeiro presente que recebeu do governo Lula, logo no início do mandato de ambos, em 2002, a saber, a antecipação do pagamento dos royalties do petróleo produzido pela Petrobras em áreas do estado.

Pena que o governo Lula, e o seu braço político local, o PT do Espírito Santo, não tenham sabido ou conseguido condicionar o presente ao ‘Imperador’ com exigências de um governo mais comprometido com as questões sociais e de cidadania e, nessa terrível questão dos presídios, com no mínimo um governo mais humano.

Na verdade, bem que algumas correntes mais combativas do Partido tentaram fazer essas exigências, mas inteligentemente Hartung atraiu para seu projeto de poder a corrente majoritária do PT/ES, chefiada pelo atual prefeito de Vitória, João Coser, que nenhuma contestação tem feito às práticas de Hartung, como se ele, Coser, não fosse no ES a liderança que tem o maior controle do Partido do atual Presidente da República, como se ele, Coser, não fosse o aliado preferencial de Hartung para a próxima eleição a governador.

Parece que inclusive já está praticamente acertado que o PT irá indicar o vice-prefeito para compor chapa com o candidato de Hartung, Ricardo Ferraço – no Encontro Estadual que irá definir se o Partido lança candidato próprio, ou se apóia candidato de outro partido, tem-se como quase certo que as correntes contrárias à aliança com Hartung serão derrotadas pelos submissos e iludidos delegados ligados a Coser, que estarão em esmagadora maioria.

Claro que toda essa movimentação de Coser e de seu grupo político em direção a Hartung naturalmente que conta com o apoio, e talvez até com a exigência da direção nacional do PT, que visa em primeiro lugar um palanque forte no ES para a candidatura Dilma; claro que temos que ser realistas e levar em conta a necessidade dessas articulações em nome de um projeto maior para o país.

Mas o problema está no grau das concessões que o PT precisa fazer nessas alianças em nome desse projeto maior. E, no caso do ES, é lamentável vermos o governo federal conceder tanto a Hartung e, covardemente, o seu Partido não exigir a contrapartida em termos de um governo mais transparente, democrático e humanizado. E, particularmente no caso da situação dos presídios, é muito triste e desalentador testemunhar a corrente majoritária do PT/ES, capitaneada pelo Sr. Coser, calar-se perante a barbárie que o governo Paulo Hartung vem perpetrando contra a população carcerária do ES.
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Ainda a respeito do texto de Elio Gaspari vale um registro interessante: ‘A Tribuna’ é um jornal de Vitória, capital do ES, um jornal até que simpático, despretensioso e bem feito, e que publica todos os domingos a coluna do referido jornalista. Só que neste domingo, 07/03, dia em que o texto de Gaspari foi publicado em inúmeros jornais do país, coincidentemente a coluna não foi publicada n’ A Tribuna.
Por esse bizarro mas nada inocente episódio, em pleno século XXI e num dos estados da região sudeste, percebe-se a descarada natureza das relações entre imprensa e poder executivo dentro do estado capitalista.

Por outro lado, e suavizando um pouco a suspeita contra o jornal, nesse mal disfarçado episódio de auto-censura, circula pela internet a versão de que foi o próprio Gaspari quem teria solicitado a não-publicação de seu artigo. Isso, se verdade, seria ainda mais preocupante, afinal provaria o temor ou a influência que um governador de um pequeno estado exerce, mesmo à distância, num dos jornalistas de maior renome no país. Coisas do estado capitalista e de suas obscuras redes de poder.

E, a propósito do horror instalado nos presídios capixabas, recomendamos acessar o site da TV Record, para ler ou assistir a reportagem do dia 08/03/2010. Num texto a ser publicado em breve tentaremos dar uma pálida idéia dessa realidade chocante, crua e competentemente mostrada pela reportagem.

2 comentários:

  1. Roberto, obrigada por se posicionar sobre esses fatos e essas administrações calhordas, que fecham os olhos para os problemas sociais, oprimem, matam e roubam na nossa cara. Ainda assim, o PT de Lula e sua turma, aliada ao "Imperador", continuam sorrindo e comendo caviar, com discurso de bons meninos.
    Na Argentina, um amigo fez uma paródia de Lula assim: "Lula fala como esquerda e assina com a direita".

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  2. Excelente texto. Realismo e sobriedade política são, ao menos na minha opinião, suas maiores qualidade. Além de ser bem escrito.
    Parabéns companheiro.

    Vitor César Zille Noronha.

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