31/03/2010

poemas para deus

Num certo sentido, a Quaresma não é algo que diga respeito apenas aos católicos, mas a todas as denominações religiosas, e até mesmo aos que não têm nenhuma crença ou vivência religiosa.
Claro, não a Quaresma em si, com todas os seus milenares rituais católicos, mas aquilo que a motiva, que a fundamenta.
Pois a Quaresma, para os católicos, é essencialmente conversão, o tempo de se interiorizar, ocasião para se refletir sobre a sua espiritualidade, a sua relação com Deus.

Dito em termos diferentes dos católicos, é momento para o indivíduo confirmar, fortalecer ou mesmo rever a sua postura em relação a algo maior do que ele, seja esse algo Deus, Fonte, Poder Supremo, Energia, Ser...
E certamente que essa atitude, de indagar acerca da existência dessa Fonte ou Presença Superior, é algo universal, inerente a todo indivíduo, enfim, constitutivo da própria condição humana.

Falta ainda registrar que obviamente não podemos negar a função de repressão, alienação e manutenção da ordem dominante, que é própria das religiões institucionalizadas.
Quanto ao caráter transformador, combativo e libertador de algumas religiões - e principalmente de alguns setores dentro da Igreja Católica, mormente na Igreja Latinoamericana - não é o propósito desses comentários. A esse respeito veja na edição de setembro de 2009 os textos O grito ecoa e O grito e a cura.

O que se vai considerar aqui, tendo como pano de fundo os poemas publicados em março, é o caráter de complexidade da relação do homem com o Ser; o que se entende aqui é que – mesmo que a pretexto de uma ação política ou artística libertadora - não podemos reduzir a inquietude e a interrogação, próprias de nossa constituição ontológica (e que para a maioria das pessoas no mais das vezes se expressa na religiosidade), não podemos reduzir essa inquietação ao fenômeno da religião, principalmente das religiões institucionalizadas, com o seu exército de igrejas e sacerdotes.

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Assim, em meio à sacra atmosfera da Quaresma dos católicos, Desvelar publica neste março poemas que falam de Deus, para Deus, com Deus, contra Deus.

Na verdade, os poemas aqui publicados desmentem o imaginário de que os poetas da modernidade seriam daqueles que mais desafiam, ignoram ou escarnecem do ícone Deus. Para alguns críticos, é até mesmo um sinal de maturidade e evolução artística quando o poeta moderno supera o seu constrangimento ou a sua arrogância para tratar do tema, com toda a seriedade - e a criatividade que lhe for própria.

Para outros, inclusive, a tarefa mais ousada dos poetas e filósofos verdadeiramente criativos e ousados deveria ser a mesma dos místicos, devotos e religiosos extremos, qual seja, chegar o mais próximo possível de Deus, do Sagrado, do da Presença Inapreensível, vê-lo Face a Face – mesmo que, ao contrário dos místicos, essa busca seja para negar a existência ou a validade desse Sagrado, dessa Presença, mesmo que seja para colocar no seu lugar outras divindades, outro Absoluto... outro Deus, tal como a Razão, a História, a Arte, o Belo, a Vida etc.

Enfim, mesmo numa civilização tão racionalista e tecnicista como o é a civilização ocidental - tão distanciada do mistério e da transcendência – não apenas os poetas, filósofos, místicos e religiosos mas qualquer pessoa, que ainda tenha um mínimo de inquietude e de abertura para o mundo, certamente tem que se haver com perguntas e descobertas acerca da origem e do sentido dela próprio e das realidades que nos cercam, que nos solicitam, nos desafiam, nos oprimem ou nos encantam.

Afinal, ainda não estamos completamente mergulhados num asséptico, incolor e assustado mundo de plástico e de vida eletrônica, ainda somos de carne, osso e consciência, ou espírito, ou alma, para quem preferir.

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Como os comentários estão um tanto ou quanto longos, preferi não publicá-los num texto único, num só bloco. Assim, logo após cada poema, vêm os respectivos comentários, que vão se encadeando e s e complementando, como se num só texto.

Aos poemas para Deus, de Deus.

Roberto Soares (Quaresma de 2010)

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