28/03/2010

pluma noturna

precisava ver!!!
acima o canto, fora do normal
preso, numa pluma viva
à vida fugidia ia

a gemer duplamente
vôo pra baixo
e entôo alto
o tom da canção

um vazio longe de encontros
navega sem leme, sem lua
sem mar... à glória
que nunca há

vicente gonçalves

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Este outro poema de Vicente Filho, se não trata abertamente do Sagrado, traz qualquer coisa de diáfano, de obscuro, que o aproxima do tema.
Não deixa de ter uma certa relação com o poema de Celan, como se Vicente estivesse a labutar com palavras e sensações, numa precária e inglória tentativa de tocar o intangível ‘nenhures’, de descrever o indizível, de colocar no papel aquilo que não se apreende claramente enquanto sentimento ou percepção, e muito menos enquanto manifestação de palavras claras, ordenadas.

Apesar disso, Vicente Filho, além de se dispor a ‘morder o nenhures’, ainda braceja para trazê-lo para perto, mesmo sabendo da impossibilidade de realizar plenamente tal tarefa – ou talvez por isso mesmo, insistindo nesse ‘canto fora do normal’, entendendo que essa talvez seja uma das mais viscerais tarefas do poeta: forcejar por dizer o indizível, mesmo sabendo-o indizível, mesmo sabendo que essa sua tarefa está condenada a uma ‘glória que nunca há’.

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